sexta-feira, 25 de outubro de 2013

ROBERTO FREIRE: 'DILMA, A DAMA DA PRIVATIZAÇÃO''

Dilma, a dama da privatização - ROBERTO FREIRE

BRASIL ECONÔMICO - 25/10

Com pompa e circunstância, a presidente da República comemorou, em cadeia nacional de rádio e televisão, com a desfaçatez de seu surrado discurso eleitoreiro, a realização do leilão do campo de Libra. Dilma Rousseff, tentando desfazer a ideia de que ela não era a dama da privatização do campo de petróleo, e ao mesmo tempo pretendendo convencer o país de que a “concorrência”, que contou com um único pretendente, foi um sucesso. Mas, para quem não se deixa embalar pelo canto da sereia da propaganda governista, está claro que o leilão foi um retumbante fiasco.

A tentativa de atrair investidores privados para a exploração de Libra fracassou. O modelo oferecido, de partilha, impôs uma noiva, a Petrobras, a quem quisesse se habilitar. As gigantes internacionais do setor não toparam o casamento. As esperadas 40 concorrentes ficaram nessa condição. Bem longe do Brasil. E do leilão, claro. Libra, que o governo propalou como maior área de exploração de petróleo do mundo, foi vendida pelo lance mínimo, sem nenhum centavo de ágio.

Se isso não significa decepção, é de se perguntar o que, então, pode representar. Capitaneando o consórcio que restou, a combalida Petrobras, empresa atolada em dívidas, terá de se virar para conseguir R$ 6 bilhões e honrar o bônus de assinatura, ou seja, a parcela de entrada, a ser paga à estatal criada para gerir a exploração do campo.

A se manter o regime de partilha, não há dúvida de que a empresa não conseguirá participar — nem ela, nem outra companhia —, todo ano, de leilões de pré-sal semelhantes ao realizado nesta semana. A partilha desmantelou a Petrobras. Foi a responsável, ainda, por inibir a participação de empresas privadas, dadas às incertezas do modelo e ao fato de o investidor não ter a garantia de poder influenciar seus investimentos, já que a estatal gestora PPSA conta com poder de veto sobre qualquer iniciativa das empresas.

A impressão que fica é que o governo escolheu uma direção baseada em interesses de curto prazo, principalmente na necessidade premente de produzir superávit primário. No entanto, não é aceitável que um país tome uma decisão de tamanha importância, envolvendo suas maiores reservas de petróleo, com a perspectiva de tapar buraco nas contas públicas. É de uma irresponsabilidade sem tamanho! Não há palanque ou fogos de artifício que refresquem o fato de que a privatização de Libra foi feita por um leilão que não houve, ou seja, um não leilão.

Também não existe maneira de negar que o governo recorreu a um arrumadinho na formatação do único grupo que participou do certame. Quem saiu perdendo com a privatização de Libra da forma como ela se deu foram a União, na condição de concessionária, e, mais diretamente, a sociedade brasileira, que mais uma vez arcará com a inépcia do governo, com seu despreparo frente a oportunidades de crescimento do Brasil. Não poderia deixar, ainda, de condenar o uso das Forças Armadas para cercar o local de realização do leilão, no Rio de Janeiro.

É um absurdo que demonstra o quanto o governo Lula/ Dilma está em descrédito junto à população. Sem contar coma incoerência que reside neste fato. Críticos contumazes da privatização quando oposição, o PT, hoje, lança mão de policiamento ostensivo para garantir a segurança de sua empreitada e impedir que os cidadãos inconformados, atrapalhem sua privatização.


'Os 178 Beagles' - REINALDO AZEVEDO

FOLHA DE SP - 25/10

A fúria justiceira dos bons pode ser tão desastrosa como a justiça seletiva dos maus

As ruas, ente divinizado por covardes, pediram o fim do voto secreto para a cassação de mandatos. Boa reivindicação. O Congresso está a um passo de extinguir todas as votações secretas, o que poria o Legislativo de joelhos diante do Executivo. Proposta de iniciativa "popular" cobra o financiamento público de campanha, o que elevaria o volume de dinheiro clandestino nas eleições e privilegiaria partidos ancorados em sindicatos, cujas doações não são feitas só em espécie. Cuidado! O povo está na praça. Nome do filme dessa mímica patética: "Os 178 Beagles".

Povo não existe. É uma ficção de picaretas. "É a terceira palavra da Constituição dos EUA", oporia alguém. É fato. Nesse caso, ele se expressa por meio de um documento que consagra a representação, única forma aceitável de governo. Se o modelo representativo segrega e não muda, a alternativa é a revolução, que é mais do que alarido de minorias radicalizadas ou de corporações influentes, tomadas como expressão da verdade ou categoria de pensamento.

A fúria justiceira dos bons pode ser tão desastrosa como a justiça seletiva dos maus. Quem estava nas ruas? A imprensa celebrou os protestos como uma "Primavera Árabe" nativa. Nem aquela rendeu flores nem o Brasil é uma ditadura islâmica. Até houve manifestações contra o governo, mas todas foram a favor do "regime petista". O PSDB talvez tenha imaginado que aquele "povo" --sem pobres!-- faria o que o partido não fez em 11 anos: construir uma alternativa. Sem valores também alternativos aos do Partido do Poder, esqueçam.

Há 11 anos o PT ataca sistematicamente as instituições, quer as públicas, quer as privadas, mas de natureza pública, como a imprensa. Dilma ter sofrido desgaste (está em recuperação) não muda a natureza dos fatos. Da interdição do direito de ir e vir à pancadaria e ao quebra-quebra como forma de expressão, passando pela reivindicação de um Estado-babá, assistiu-se nas ruas a uma explosão de intolerância e de ódio à democracia que o petismo alimentou e alimenta. O Facebook não cria um novo ator político. Pode ser apenas o velho ator com o novo Facebook --como evidenciou a Irmandade Muçulmana no Inverno Egípcio.

Em política, quando o fim justifica os meios, o que se tem é a brutalidade dos meios com um fim sempre desastroso. A opção moralmente aceitável é outra: os meios qualificam o fim. Querem igualdade e mais Justiça? É um bom horizonte. Mas será o terror um instrumento aceitável, ainda que fosse eficaz? Oposição, governo e imprensa, com raras exceções, se calaram e se calam diante da barbárie que deseduca e que traz, volte-se lá ao primeiro parágrafo, o risco do atraso institucional.

O PSOL conduziu uma greve de professores contra o excelente plano de carreira proposto pela Prefeitura do Rio. Era a racionalidade contra a agenda "revolucionária". Luiz Fux, do STF, posando de juiz do trabalho, chamou os dois para conversar. É degradação institucional com toga de tolerância democrática.

O sequestro dos beagles, tratado com bonomia e outro-ladismo pelo jornalismo, é um emblema da ignorância dos justos e da fúria dos bons. Eles atrasaram em 10 anos o desenvolvimento de um remédio contra o câncer, mas quem há de negar que os apedeutas ilustrados têm um grande coração?


Biografias inacabadas - FERNANDO GABEIRA

O Estado de S.Paulo - 25/10


Na cadeia se diz: aqui o filho chora e a mãe não ouve. Na política a expressão é outra: a situação está de vaca não reconhecer o bezerro. Ambas denotam uma crise, pela suspensão do amor materno, e revelam um certo desamparo, um mundo de ponta-cabeça.

Às vezes a atmosfera político-cultural do Brasil, neste longo período de dominação do PT, transmite essa sensação, mais evidente nas ruas, onde quase toda manifestação termina em violência, mesmo quando sua bandeira é a defesa dos animais.

Marina Silva lançou a ideia de salvar Dilma Rousseff dos políticos fisiológicos, evitando que deles se torne refém. Não ficou muito claro para mim. Passa a ideia de uma donzela imaculada assediada por experientes chantagistas, como se o governo não fosse também um fator decisivo nesse processo. Onde a proposta de Marina sugere dependência, vejo uma interdependência. Se consideramos o governo refém da fisiologia, é preciso reescrever a história do mensalão, isentando o partido do governo de sua maior responsabilidade.

Também não entendi, no front político-cultural, a defesa da autorização prévia de biografias. Tantas pessoas queridas, entre elas Caetano Veloso - a quem tenho gratidão - embarcam num equívoco por falta de um debate mais amplo.

Para começar, a importância das biografias em nossa formação. Pela trilogia de Isaac Deutscher sobre Trotsky muito se aprendeu sobre a Revolução Russa e os bolcheviques. Sem Rüdiger Safranski não teríamos uma história equilibrada da vida de Martin Heidegger, sem Robert Skidelsky não conheceríamos a vida de lorde Keynes. É um território delicado, pois sem as biografias não conheceríamos a vida de Mao Tsé-tung, nem os pecados dos nossos políticos - que certamente iriam aproveitar-se desses dois artigos inconstitucionais que determinam autorização prévia para publicação de biografias.

Os argumentos também foram defendidos de forma ambivalente. Na maioria das vezes, falava-se em defesa da privacidade. Mas, em outras, surgia a questão do dinheiro, da falsa suposição de que biografias no Brasil rendem fortunas. O artigo de Mário Magalhães contando suas dificuldades para biografar Carlos Marighella é muito mais próximo da realidade, pois revela como ele gastou dinheiro do próprio bolso para completar o seu livro.

Quando surgem de um mesmo núcleo a defesa da privacidade e demandas financeiras, cria-se a falsa impressão de que são intercambiáveis. Quanto custariam, por exemplo, os detalhes da relação com a cunhada numa biografia de Sigmund Freud?

De um ponto de vista existencial, os admiradores dos grandes artistas que participam do movimento ficam preocupados com um debate biográfico. Ainda esperamos deles tantas canções, tantos espetáculos, tantas aventuras políticas, tantos amores... Quem sabe o melhor não virá nos últimos capítulos, nos anos ainda não vividos?

Nas ruas, os black blocs de uma certa forma conseguiram propagar a violência. Isso só é possível por falta de uma certa cartilagem tecida pela política. Tudo vai direto ao osso, termina em incêndio e pancadaria.

Historicamente, essas ondas de violência levam a leis mais rígidas e mais repressão. Quem vem de longe tem o dever de lembrar isso. Mas leis mais rígidas não resolvem sozinhas. O sistema político no Brasil precisa recuperar o mínimo de credibilidade e o sistema repressivo, desenvolver o mínimo de inteligência e capacidade de análise.

No passado os políticos metiam-se no meio dos conflitos com a disposição de atenuá-los. Hoje fogem dos conflito com medo justificado de apanhar da multidão. O Congresso foi incapaz de produzir um debate sobre a violência nas ruas. A sensação é de que as raposas políticas aceitam a explosão de violência porque sabem que ela os ameaça menos que os grandes protestos de massa. Na verdade, ao inibir potenciais manifestações pacíficas os black blocs criam uma camada de proteção útil ao político que se aproveita da confusão para seguir sendo o que é.

O mundo está mesmo virado. Os black blocs consideram-se revolucionários. E no momento em que poderosos instrumentos internacionais devassam a privacidade de bilhões de pessoas, nosso tema central é a biografia de pessoas famosas.

A defesa do aumento do consumo como o único valor político moral nos levou a esse abismo. A gente não quer só comida. Os artistas têm um grande papel na superação dessas ruínas, sobretudo as de Brasília. Grandes momentos nos esperam e Chico Buarque foi bastante simples ao dizer: "Se a lei é esta, perdi".

A lei é a Constituição. Se não for essa, teremos perdido nós. Não deixarei de lamentar uma contradição tão explícita entre a sentença e um dos seus artigos essenciais: o que prevê a ampla liberdade de expressão.

No momento, o filho chora e a mãe não ouve, a vaca não reconhece o bezerro. É a crise. Suspensa a presença materna, temos de enfrentar uma certa solidão na busca pela saída. O caminho será encontrado via diálogo, mas sem a ilusão de considerar o governo refém da picaretagem. Foi o governo, em sua estreiteza e seu materialismo vulgar, que acabou provocando essa crise: a galinha aterrissou do voo econômico e só cacareja no chão suas previsões otimistas.

Estamo-nos acostumando com as chamas urbanas. Uma pedrada aqui, um coquetel molotov ali, produzimos uma rotina burocrática, sintonizada com o pântano político. Nos fronts político, social e cultural o alarme está soando há algum tempo. Conseguimos sobreviver a uma longa ditadura militar. Será que vamos capitular diante de um governo que distribui cestas básicas e Bolsas Família?

O País foi moralmente arrasado pela experiência petista e de todos os cafajestes que o governo conseguiu alinhar. Predadores oficiais e predadores de rua se encontram nessa encruzilhada em que um profundo silêncio político se abate sobre nós, com exceção de vozes isoladas.

Precisamos reaprender a conversar, reafirmar valores políticos que não se resumem a casa e comida. Precisamos viver a vida, cuidar mais da bio que da grafia. Precisamos sair dessa maré.

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