sexta-feira, 22 de maio de 2015

"Crime reforça pressão por nova maioridade penal", editorial de O Globo

Apreensão de suspeito, menor de idade, de ter matado médico na Lagoa é mais um entre um sem-número de atos de violência que ficam sem punição


Crimes como a morte do médico Jaime Gold, e outros com o envolvimento de adolescentes, são tragédias anunciadas que se alimentam na esquizofrênica resistência de parte da sociedade a enxergar uma realidade insustentável. Como em ocorrências anteriores em que a violência dos criminosos levou ao óbito, ou provocou ferimentos graves nas vítimas, também desta vez há fortes indícios de participação de jovens com idade inferior a 18 anos. Ou seja, de antemão virtualmente inalcançáveis pela Justiça, um salvo-conduto balizado pelo Estatuto da Criança e do Adolescentes para a criminalidade sem o risco de punição efetiva.

Ontem, um dos suspeitos da morte de Gold foi, no jargão politicamente correto, “apreendido”. Aos 16 anos, o rapaz já tem uma vida longa no crime, com 15 anotações criminais — a primeira das quais aos 12 anos. E, pelo protocolo, não é difícil adivinhar que essa provável 16ª anotação terá a mesma tramitação das anteriores: inimputável, graças ao anteparo do ECA, logo ele estará de volta às ruas, ao círculo vicioso da violência, incorporando mais ocorrências ao prontuário — ou sendo ele mesmo uma nada improvável vítima dessa realidade que produz tragédias em série.

Não é mais argumento a ser colocado na mesa a suposta atenuante de que jovens com menos de 18 anos não têm consciência de seus atos. Falso. Fora a evidência de que adolescentes ingressados na marginalidade têm maturidade suficiente para medir o grau de violência que empregam para intimidar as vítimas, outras duas particularidades desses crimes em série desfazem essa impressão. Uma delas diz respeito à consciência do abrigo que o ECA lhes oferece. Não é por acaso que esses rapazes praticam crimes desembaraçadamente, à vista de quantos estejam testemunhando: o Estatuto os protege. 

Outra, a inegável rede de informações que os bandos trocam entre si, do que é prova o uso, cada vez mais constante, de facas em assaltos na rua. Sabem que portar arma branca não é prova de crime, um conceito que os delinquentes aprenderam e adotam em favor de seus atos.

Contra a flexibilização da lei brande-se também a relativização do envolvimento de menores em crimes, principalmente homicídios. Por menor que seja o índice, não é por isso que atos de violência, principalmente os que levam à morte, deixam de ser trágicos — logo, graves.

O debate sobre a inimputabilidade de delinquentes juvenis é contaminado por esse tipo de argumentos que desfocam a discussão. Espera-se que, agora, as trágicas consequências de crimes como o desta semana na Lagoa contribuam para dar-lhe o rumo correto. Da parte do Legislativo, as ações parecem bem encaminhadas com a aprovação, na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, da emenda que reduz para 16 anos o limite da inimputabilidade penal — o que poderia ser feito dando-se ao juiz competente o arbítrio de decidir pela punibilidade de acordo com a gravidade do caso. Um choque de realidade que precisa ser corroborado pelo plenário.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

O ESTADO POLICIAL AVANÇA - RAFAEL BRASIL

O estado policial do consórcio PT STF avança contra a oposição. Desde a semana passada, dois deputados federais tiveram "visitas" ...