quarta-feira, 26 de outubro de 2016

ENTREVISTA COM JOSIAS TEÓFILO E MATHEUS BAZZO SOBRE O FILME QUE RETRATA AS IDÉIAS DE OLAVO DE CARVALHO.

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É impressionante. Mal acabei de mencionar aqui a entrevista completa do Josias Teófilo e do Matheus Bazzo à Folha, e imediatamente algum engraçadinho tirou esse material do ar. Aí vai o texto integral:
Entrevista completa para o site do UOL
Confira abaixo a entrevista completa concedida por e-mail ao jornalista Tiago Dias para o site do UOL. Você pode ver a matéria publicada no site clicando aqui
Você se graduou em Jornalismo, fez mestrado em filosofia, focado na obra de Andrei Tarkóvski. Quando foi que você conheceu Olavo e sua obra? Como surgiu a ideia de acompanhar a vida do filósofo em um documentário?
Josias Teófilo: Na verdade eu não conclui o mestrado em Filosofia, optei por seguir um caminho diferente do que a minha orientadora aconselhou e acabei sendo desligado do programa por isso. O texto do que seria a minha dissertação será publicado em 2017 por uma grande editora brasileira – é por isso que estou aqui em Moscou – além de um novo filme que estou fazendo um roteiro, sobre a relação entre Andrei Tarkóvski e Pável Florenski.
Eu conheci Olavo em 2008, através da minha amiga Daniela Gouveia, vi as aulas de história de filosofia dele e fiquei absolutamente fascinado. Depois, me tornei aluno do Seminário Online de Filosofia, que é um curso que Olavo mantém há 5 anos pela web.
A ideia surgiu repentinamente, pensei primeiro num curta feito de forma simplória. Porém, depois de visitar Wagner Carelli (o criador da Revista Bravo!) na sua casa em Campos do Jordão, eu contei pra ele a ideia do filme e ele disse: “Isso tem que ser um longa, eu pago as passagens, nós vamos lá e fazemos”. Assim nasceu O Jardim das Aflições. Ele nem precisou pagar as passagens, nós fizemos um crowdfunding, que foi o maior para um filme da história do Brasil.
Matheus Bazzo: Um filme sobre Olavo de Carvalho era algo iminente. Inclusive, depois da nossa iniciativa, descobrimos outras pessoas que também estavam se organizando para fazer um filme sobre ele. E não poderia ser diferente, a personalidade de Olavo de Carvalho é muito curiosa que desperta interesse e admiração em alguns e ódio entre outros. Isso por si só já chama atenção para uma personalidade que precisava ser retratada em um filme. A mim a ideia surgiu também repentinamente em uma viagem que eu estava fazendo. Foi até engraçado pois eu estava pensando em quem chamar para fazer o filme e o nome de Josias foi o primeiro que me veio em mente. Eu já conhecia suas fotografias e seu curta-metragem O Quarteto Simbólico. Quando apresentei para Josias um pequeno argumento do filme – que eu também havia concebido inicialmente como um curta -, ele me respondeu: “Sua ideia é muito boa. É tão boa que já estou a dois meses trabalhando nela.”
O filme parece focar na intimidade, mas também abre espaço para seus pensamentos. Havia a vontade de dar ainda mais visibilidade para o discurso de Olavo? Por qual razão?
Josias: Não é propriamente na intimidade, mas na vida cotidiana. A verdade é que o filme não é sobre Olavo, mas sobre o mundo segundo Olavo, por assim dizer. O filme é composto de uma série de temas encadeados numa narrativa. A primeira parte se chama “Contra a tirania do coletivo”, em que Olavo defende que a liberdade (ao contrário do que se fala comumente) do indivíduo só tem diminuído na modernidade, com o aumento dos meios técnicos que o estado tem desenvolvido. A segunda é a solução para o problema posto na primeira parte, ou seja, como o indivíduo pode lutar contra essa situação. E a terceira parte é sobre as ideias dos náufragos, ou seja, as ideias são tão importante a ponto de permanecer conosco em face da morte – somente elas importam. Então, tudo que é tratado no filme não é importante por ser Olavo falando, mas em si mesmo. Até um militante do PSol pode se identificar com o que é dito ali. Todos os esquerdistas que eu mostrei tem gostado do filme.
Matheus: É importante separar a linguagem que usamos no marketing da campanha de arrecadações da linguagem do filme. É evidente que uma campanha de marketing precisa ser mais incisiva e polêmica, sem muito espaço para o discurso poético. Essa diferença é perceptível logo no primeiro teaser que lançamos. Com ele já é possível ver que a proposta do filme mostrar o pensamento de Olavo de Carvalho através do cinema – sem espaço para jargões ou discurso político.
Em relato nas redes sociais, o diretor do fotografia do filme, Daniel Aragão, disse que tinha uma imagem diferente de Olavo até conhece-lo. Não à toa, ele diz que tem sofrido represálias dos colegas pernambucanos – principalmente do cinema – por defender o personagem e por ter participado do filme. Você recentemente gravou um vídeo dizendo que estava sofrendo a mesma perseguição na universidade. O que mais tem acontecido desde que o projeto tomou corpo? E porque você acha que essa reação tem acontecido?
Josias: Sim, a situação no Recife tornou-se insuportável para Daniel Aragão depois do filme, o que demonstra a intolerância desse meio com quem pensa diferente. Daniel emprestou o carro dele, um Opala antigo, para ser usado no filme Aquarius, e quando voltou da viagem do meu filme e foi buscar o carro no set, ele sentiu o clima completamente hostil que se formou contra ele. A partir daí a relação dele só se degradou com o meio em que ele era tão querido. Comigo aconteceu o mesmo, só que eu sempre estive de fora desse meio. Daniel saiu do país por causa da perseguição que se seguiu. E eu farei o mesmo em novembro.
Vocês – e os colaboradores do filme – também defendem que o longa está sendo censurado em festivais. Gostaria de saber ao certo, em quantos festivais vocês inscreveram o longa, e qual foi o retorno em cada um dos casos?
Josias: Eu não sei se a palavra certa é censura, porque eles tem todo direito de não selecionar um filme – não é nenhuma novidade que curadoria envolve elementos que são pessoais, circunstanciais etc. Censura foi tentarem constranger os profissionais a não trabalhar no meu filme (como o cineasta Marcelo Pedroso fez, por exemplo). O problema é que os critérios exclusivamente políticos se mesclam com julgamentos estéticos. E exatamente no momento em que o meio artístico brasileiro (praticamente todo instrumentalizado pelo PT) está vendo seu mundo ruir. Selecionar para uma mostra competitiva um filme sobre Olavo de Carvalho (o filósofo que previu a ascensão do PT e todos os seus crimes) seria dar um trunfo ao inimigo. Eduardo Valente não deixaria nunca isso acontecer. Até porque essa gente sustenta o mito de que o cinema brasileiro só existe porque tem recursos estatais, não existiria sem. E eu provei que é possível fazer um longa-metragem – filmado nos EUA, com uma RED Dragon, drone e o escambau – sem um centavo da burocracia estatal. Esse filme tem ajudado a destruir o mundo em que eles viveram durante tantos anos, assim como o impeachment e, em breve, a prisão de Lula. Se bem que eu nem vejo como grande mérito demolir o castelo de areia do esquerdismo cultural brasileiro.
Na campanha vocês dizem que o filme precisava passar por festivais para ser lançado. Por quê? A ausência deles nestes eventos tem prejudicado a ideia de lança-lo? Quais são os planos para colocá-lo no cinema?
Josias: Eu supus inicialmente que seria importante a participação em festivais nacionais para conseguir distribuir o filme comercialmente. Mas hoje noto que na verdade o sucesso em festivais nacionais é praticamente sinônimo de fracasso comercial. É que o meio cinematográfico é composto – literalmente – por uma elite alienada, que vive num mundo próprio, bem diferente do mundo onde vive a população brasileira. O plano é convencer os programadores dos cinemas do potencial de público que tem o filme. Basta dizer que ele teve mais doadores do que filmes milionários brasileiros tiveram de público – quase 3 mil doadores. Com ou sem festivais, no começo de 2017 lançaremos o filme. E usaremos a recusa dos festivais para promover o filme, inclusive no trailer.
O filme “Aquarius” chegou aos cinemas como uma reclamação semelhante. Sua equipe acredita que sofreu represália após o protesto contra o impeachment da Dilma em Cannes. Vocês acreditam que vocês tenham algo em comum?
Josias: Não, absolutamente nada. Aquarius é um filme feito com mais de 3 milhões de dinheiro público, com distribuição comercial da Globo Filmes, com financiamento direto dos donos do Itaú, e com um imenso lobby nacional e internacional. A celeuma causada pela posição do Marcus Petrucelli só mostra que ele é o único dissidente. O filme não foi escolhido para representar o Brasil no Oscar por causa dos seus problemas – que foram evidenciados por inúmeras críticas, como a de Eduardo Escorel. Eu gosto muito de O Som ao Redor – sou suspeito, uma das cenas foi gravadas na minha casa no Recife, e ele retrato o meu bairro lá – mas Kleber se cercou exclusivamente de puxa-sacos, e isso se refletiu em Aquarius. O filme tem problemas básicos, elementares, de roteiro, de direção de arte, de montagem, que seria evitados se ele tivesse pessoas sinceras ao redor dele, que não vivessem lambendo o seu saco. Entretanto, existem coisas preciosas no filme, e elas tem haver com a figura que o inspirou, Joselice Jucá, uma historiadora brilhante, que é a mãe de Kleber.
Assistiram Aquarius? O que acharam do filme e do protesto?
Josias: Eu gosto do filme, e indiquei a todos. Mas é evidente que o filme tem problemas, e não são poucos. Basta dizer que o filme tem 45 minutos a mais do que poderia ter, na verdade. O protesto foi algo esperado e lamentável. O próprio Kleber Mendonca Filho se contradisse no jornal, ao dizer que nós vivemos numa democracia. Ele tem que se decidir: ou houve golpe ou estamos numa democracia, não dá pra ser os dois ao mesmo tempo. Como eu falei, o filme tem coisas precisosas, e elas tem haver com a experiência verdadeira por trás da ficção, que é da vida de Kleber, mas se perde em esquematismos ideológicos de luta de classe. O mal que padece todo o cinema nacional.
Vocês dizem que não há espaço no Brasil para se fazer um documentário sobre Olavo com recursos públicos. Vocês chegaram a inscrever o filme em projetos? Por quê? É contra a Lei Rouanet e outras políticas públicas para o audiovisual?
Josias: Não inscrevemos mas é evidente que não passaria em nenhum edital, jamais. Talvez na Lei Rouanet, mas não seria adequado ao espírito do projeto. Eu não sou contra a Lei Rouanet – e nisso discordo do da direita brasileira –, sou contra a utilização política que é feita da Lei Rouanet como do dinheiro público que vai para cultura de uma forma geral. E isso não é uma coisa explícita, e nem poderia ser, mas uma forma velada e eficiente de promover visões de mundo específicas.
Matheus: Além disso, a escolha pelo formato crowdfunding nos deu muito mais agilidade e liberdade para a produção do filme. Nós sabíamos das complicações que seria entrar em um edital e da possível recusa. Dessa maneira, conseguimos organizar a equipe, fazer a campanha de arrecadações, filmar nos EUA e editar o filme em cerca de um ano. Sem contar que um dos nortes do filme é a força da iniciativa individual contra a coletividade. Não seria condizente com o próprio discurso do filme se tivéssemos que depender de leis de incentivo para realizá-lo.
Como vocês estão vendo o novo governo e o ministro da cultura? Haveria espaço para tentar um acordo de distribuição agora?
Josias: Não vejo a menor possibilidade de parceria com instituições ligadas à cultura para esse filme. Matheus Cartaxo resumiu bem o contexto: “Esse filme nasceu como uma invenção e vai terminar como uma invenção”. Lembre-se que quem assumiu a presidência foi o vice de Dilma Rousseff – os petistas hoje o odiarem não muda esse fato. Todo mundo na área de cultura morre de medo de desagradar os petistas – que são poderosos e ainda em maioria. Olavo não é só odiado pela esquerda. Esse filme não teve o apoio de nenhum político, nem mesmo do DEM, ou de partidos chamados de direita. Essa gente nem sabe o que é cultura.
Olavo é uma figura controversa, tido como guru por uns, e como reacionário e preconceituoso por outros. Existe a intenção de produzir arte voltada ao público conservador?
Josias: Olavo é um homem sincero e verdadeiro. Com todo mundo ele é assim, essa é a sua melhor qualidade. Olavo é a única pessoa que eu conheço que se eu mostrar um livro, um texto ou um filme, eu vou ouvir uma opinião verdadeiramente sincera. Isso é uma preciosidade no mundo de hoje. Ele não é um guru. Por exemplo, eu sou vegetariano, ele é caçador de urso. Ele nunca tentou me convencer a deixar meu vegetarianismo, nem eu nunca tentaria fazê-lo deixar de caçar (até acho muito mais digno comer carne de caça do que comprada no supermercado). Tem alunos de Olavo que são muçulmanos, evangélicos, metaleiros. Ele é uma das pessoas mais tolerantes que eu já conheci na minha vida, e nos ensina isso, a partir do filósofo francês Louis Lavelle.
Matheus: Não existe intenção de produzir arte para um público específico. Não é possível produzir algo realmente relevante tendo como motivação um grupo específico de pessoas, seja de esquerda ou de direita. O que me motivou a fazer esse filme, e outros que estou produzindo, é a importância do tema em si, independente do interesse de qualquer grupo. São assuntos importantes que precisam ser representados artisticamente. Se eu deixasse minha motivação vir de um grupo específico, minhas ideias estariam presas a esse grupo.
Qual a principal mensagem de Olavo que precisa ser transmitida para o público?
Josias: A principal mensagem está no cartaz do filme, e é uma frase que retiramos de uma das suas falas dialogando com Goethe: “A maior força que existe é a personalidade humana”. Nós estamos aqui na Rússia perto de uma das estações do metro que foi construído com trabalho forçado de presos, inclusive presos políticos, no tempo de Stalin. Quantos artistas brilhantes foram mortos por esse regime genocida! Entretanto, a cultura e a espiritualidade (duas faces de uma mesma moeda, segundo Tarkóvski) permaneceram. Porque ninguém pode contra a interioridade criadora do ser humano. Nem Stalin, nem o petismo cultural, nem os fascistinhas do cinema nacional.

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